Rede é uma palavra com infinidades de significados, o que aumenta ainda mais quando pensamos nas apropriações metafóricas das quais é alvo. No entanto, há algo em comum que uni tantas atribuições a este simples vocábulo de duas sílabas, quatro letras, duas consoantes e duas vogais, a idéia que carrega de conexão.
A rede, enquanto acontecimento e não palavra, tem origem muito antes de qualquer existência, sendo estabelecida no momento em que surgiu o primeiro átomo no universo, onde elétrons, prótons e nêutrons se conectam numa rede de forças e cargas. Claro que pode ter havido outras estruturas enredadas antes do átomo, mas o que se quer aqui é dar a entender que a idéia de rede enquanto estabelecimento de conexões está no fundamento da origem.
Assim como na gênese, a rede parece se fazer presente por todo o percurso da existência. O universo tende à rede. Essa conclusão pode ser tirada na medida em que todo o espaço sideral parece estar conectado numa rede energética que configura as movimentações, localizações e organização de todos os corpos celestes, o átomo se configura numa pequena estrutura em que elementos ainda menores se relacionam num jogo de forças e cargas, na natureza os seres convivem em diferentes redes, na maioria das vezes, necessárias a auto-sustentação da mesma, os homens cada vez mais estabelecem novas e diferenciadas formas de redes, e outros infinitos casos podem justificar esta afirmação.
Dando enfoque às redes estabelecidas pelo Homem, pode-se dizer que a primeira aconteceu quando dois indivíduos entraram em contato, dai para frente, seguindo a tendência de toda a existência, esta rede foi aumentando, se diversificando e se complexificando. O barato do Homem é que ele, percebendo esta sua potencialidade e necessidade, por ser um ser social, caminhou no sentido de expandir suas conexões, criando novas redes e ampliando-as pelo mundo, desenvolvendo tecnologias que tornaram este processo cada vez mais intenso, abrangente e interativo.
Diferentemente das tramas de um tecido, de uma tarrafa, da teia de uma aranha, de um bordado e até mesmo das estabelecidas em um átomo, o desenho das redes humanas não se dá para estruturar num esquema inteligível em sua totalidade, o que fica mais inatingível na medida em que este desenho está em contínua expansão e transformação, emaranhando ainda mais os fios e conexões. Todavia, é possível fazer recortes, claro que dentro de um foco de análise, que viabilizem o estudo e entendimento das redes.
Apesar de ser surpreendente a magnitude que alcançou a estrutura das redes humanas, possibilitando até mesmo uma interação mundial, da qual quase nenhum ser humano escapa, cabe ressaltar que as relações de poder dentro delas são desiguais, havendo poucas dessas redes, muitas vezes sem força suficiente, que combatem a esta desigualdade ou propõe opções alternativas de se estabelecer conexões.
Quando aqui se fala em redes humanas, está se fazendo referência às relações sociais, culturais, históricas, econômicas, científicas, artísticas, internacionais, regionais, familiares e mil outras que podem existir, mas também das tecnologias como o jornal, revistas, televisão, telefone, internet e outras mais. Vale ressaltar que todas estas redes estão interligas e se transpassam, constituindo um todo de redes humanas.
Este todo de redes humanas poderia ser um espaço democrático e igualitário, no entanto ideologias dominantes acabam por se aproveitar da complexidade das redes, por melhor conhecê-las e, muitas vezes, por detê-las, configurando um sistema que se infiltra por elas como algo natural, contra o qual na se pode lutar. No que se refere a tecnologias, a internet é uma das poucas, se não a única, que apesar de ter sido criada para a guerra, abre as portas para o estabelecimento de redes diversas, dificultando bastante a imposição de uma ideologia predominante.
Meios de comunicação como o jornal, a televisão, o rádio e outros estabelecem conexões, ou seja, redes, mas estas se configuram pela centralidade de informação e ação nos meios, deixando os espectadores, leitores e/ou ouvintes, em grande parte das vezes, como atores passivos desta relação, que se configura num fértil terreno para as ideologias dominantes. Já a internet é um espaço aberto, pelo menos ainda (exceto em alguns países), que permite a qualquer um lançar suas idéias, informações, imagens ou qualquer dado numa rede de alcance mundial, claro que, dependendo do conteúdo, com suas devidas conseqüências.
Pensado no âmbito das Artes Visuais, a rede não é uma coisa da contemporaneidade, afinal grandes artistas da antiguidade, da idade média e do renascimento contaram com uma rede de aprendizes para executar seus trabalhos, artistas trocaram cartas entre si falando, principalmente, sobre suas produções, movimentos de vanguarda modernistas criaram redes mundiais e muitas outras formas de conexões foram estabelecidas. Claramente, com a abertura criada pela arte contemporânea e com as possibilidades tecnológicas da atualidade, trabalhos de arte florescem no âmbito do estabelecimento de redes, sendo este um campo que precisa ainda ser muito explorado pelos artistas, principalmente, pelo sua expansão motivada pelos meios de comunicação, com destaque para a internet.
No entanto, apesar da internet ser um meio muito interessante de se manusear para a produção de trabalhos em e com rede, é muito importante que seja vista pelos artistas como uma maneira de se intensificar e ampliar uma forma já existente de rede, os coletivos. A vida tem se tornado muito corrida nos tempos atuais, fazendo com que as pessoas tenham menos tempo para estarem juntas, trocarem idéias, e isso também afeta a classe artística, que cada vez mais trabalha individualmente.
O trabalho coletivo permite troca, discussão, debate, gerando resultados muito satisfatórios, mas o que se destaca nele é sua potencialização do poder de resistência, que pode ou não ser aproveitado. A arte também pode ser um espaço como a internet, mas ainda há muitas ideologias dominantes que a cercam, afinal a centralidade das informações e ações é uma realidade nesse campo, propiciando essa predominância.
Desta forma, se faz necessário que artistas não se limitem a fazer trabalhos em rede, mas façam da arte um meio-rede, onde estejam em pleno contato, trocando por meio de suas conexões e abrindo também espaços para os outros atores pertencentes a seu meio (público, arte-educadores, museus, galerias, etc) sem que ninguém prevaleça sobre ninguém, mas que todos possam colaborar e todos estejam abertos a diferenças de concepções. Tudo isso pode parecer utópico, mas é uma forma de resistir ao estabelecido e ir em busca de novas possibilidades, sendo a internet uma grande aliada. Fabricio Gabriel
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